sexta-feira, 8 de abril de 2011

Contos do Reino #6- O Desafio de Herói

2 Timóteo 1:7

Pois Deus não nos deu espírito de covardia, mas de poder, de amor e de equilíbrio.

1 João 4:16-18

Assim conhecemos o amor que Deus tem por nós e confiamos nesse amor. Deus é amor. Todo aquele que permanece no amor permanece em Deus, e Deus nele. Desta forma, o amor está aperfeiçoado entre nós, para que no dia do juízo tenhamos confiança, porque neste mundo somos como ele. No amor não há medo; pelo contrário o perfeito amor expulsa o medo, porque o medo supõe castigo. Aquele que tem medo não está aperfeiçoado no amor.

Efésios 4:22-24

Quanto à antiga maneira de viver, vocês foram ensinados a despir-se do velho homem, que se corrompe por desejos enganosos, a serem renovados no modo de pensar e a revestir-se do novo homem, criado para ser semelhante a Deus em justiça e santidade provenientes da verdade.

O DESAFIO DE HERÓI

Há muito tempo atrás, hoje e para sempre havia e há e sempre haverá um Cuidador que está eternamente ocupado em criar e cuidar de novas idéias. Mas as idéias de que ele mais gosta são aquelas que ele planta na mente de crianças.

"Nunca vou ter a coragem de ser um Atalaia", disse Herói um dia, quando estava observando o Cuidador criar flores no meio da Floresta Silvestre. O menino estava sentado com a sua mão cobrindo a sua cicatriz. As pessoas no Grande Parque nunca o xingavam, mas o menino estava certo de que já as tinha pego olhando para ele. Ele pensou que provavelmente falavam sobre ele quando ele não estava perto.

"Tenho uma nova idéia", disse o Cuidador. "Vamos tentar isso e ver se fica legal. Ta-doo!" O velho homem fez um gesto com as suas mãos em frente do seu rosto. Uma flor amarela brilhante explodiu da ponta do talo.

"Ta-daa..." disse Cuidador de novo. A flor mudou. Desta vez, ela ficou com um centro cor de laranja e as pétalas ficaram achatadas e arredondadas ao invés de pontudas.

"Não, não, não. Não fico bom. Não tá legal". Cuidador balançou sua cabeça. "Deixe-me ver..." Ele pensou mais um pouco, com a mão no queixo.

O velho de repente levantou a cabeça, com um brilho forte nos seus olhos cinzas. "Aha! Já sei!" Ele levantou seus braços. "Te-dee!"

A flor estremeceu e logo depois suas pétalas de dentro ficaram espetadas e as de fora ficaram lisas e arredondas na beirada!

"Ah-hah!" gracejou Cuidador. "Perfeito. Perfeito. Legal. Absolutamente lindo. Agora fique olhando rapaz! Fique olhando".

O velho ficou na ponta dos pés. Seus cotovelos estavam dobrados, mas erguidos; e aí ele começou a balançar os braços. As facas e tesourinhas e pazinhas em seu colete começaram a tinir. "Ta-dee! Ta-dee! Ta-dee!" Mais flores explodiram.

Cuidador balançou seus braços ainda mais. Ele apontou. "Ta-daa!" Pétalas e talos. "Ta-dee!" Um esguichar de amarelo. "Ta-doo!" O chão do bosque ficou atapetado com um tom de manteiga, cada flor delicadamente alaranjada no meio.

Cuidador girava e girava. "Ai, são lindas!" Ele sentou-se. "Lindas!" Ele colocou a mão na barriga e riu, só pelo prazer de criar.

Herói ficou abismado. Ele já tinha ouvido que o Atalaia Comandante e esse velho Cuidador eram a mesma pessoa. Os poderes contidos em cada um continuamente o surpreendia. Um tinha o poder de liderança; o outro tinha poder sobre a criação. Herói estava aprendendo a amar as duas faces, mas de maneiras diferentes.

Cuidador parou com seu divertimento, radiante. Ele limpou seus olhos. "O que você estava dizendo, rapaz?"

Por um momento, Herói não conseguia lembrar-se. Ele continuava vendo flores selvagens explodindo em sua mente. Aí ele se lembrou. "Eu disse que nunca vou ser corajoso". No fundo do seu coração Herói queria ser um Atalaia, um vigia nas torres, sempre cheio de coragem e verdadeiro. O menino olhou para baixo. Ele segurou com mais força ainda a sua mão cobrindo seu rosto. "Eu acho", ele continuou, "que você me deu o nome errado".

"Tolice", disse Cuidador. O velho homem ficou de pé. Ele encaixou sua barba de novo no seu cinto de videira, colocou de volta algumas ferramentas nos seus bolsos, e pegou seu chapéu do chão que era uma pequena horta brotando. Ele pegou o rapaz pelos ombros. Sua voz era baixa e bondosa. "Só um menino com um coração de herói teria desafiado o Encantador para poder achar um Rei. Sempre se exige coragem para crer".

Mas Herói sabia que ele só tinha procurado o Grande Parque porque estava com medo: medo do Encantador, da praça das cinzas, medo do fogo e de ser um órfão. Herói tentou fazer com que sua gola cobrisse a marca na sua face. Sua voz implorava: "Não dá para você me fazer corajoso? Será que não dá para você me dar algo para tomar ou comer que me faria corajoso? Você pode fazer qualquer coisa. Não dá prá você me transformar em um menino corajoso?”

Com ar sério, Cuidador abanou o seu dedo ao lado da sua cabeça. "Deixe-me ver...ummm...vamos ver...Eu sei! Eu Sei! Você precisa de um desafio. É, é isso aí, um desafio. Heróis sempre precisam de um desafio".

"Um desafio?" perguntou Herói. Ele esperava que não fosse nada como andar em cima de brasas vivas descalço ou ficar no meio de um círculo de chamas.

"O que poderia ser? Vamos ver..." A voz de Cuidador interrompeu seus pensamentos. "Socorrer uma princesa? Não, não, não! Só temos uma princesa em Grande Parque e ela não necessita de ser socorrida".

Herói pensou em Amanda e concordou com Cuidador.

"Que tal passar por aquilo que você mais teme?"

O coração de Herói começou a dar socos no seu peito. Ele pôde ouvir o som das chamas lambendo a madeira.

"Não, não, não" Cuidador respondeu com risadas ao ver o olhar de horror que tomou posse do rosto de Herói. "Todas as coisas em seu tempo devido: Vamos ver..."

Herói conseguiu respirar bem fundo. Que tal esquecer essa idéia toda de um desafio? Talvez ele acordaria uma bela manhã e se sentiria corajoso.

"Eu sei!" gritou Cuidador. Ele levantou seu dedo no ar. "Você deve enfrentar seu maior inimigo em combate justo!"

Quem que é o meu maior inimigo? pensou Herói. Queimadores? Suor frio começou a escorrer pelo meio das suas costas. Talvez houvesse algo terrível e escondido nas sombras mais escuras da Floresta Profunda, pronto para atacá-lo.

"Agora, vamos lá", disse Cuidador. "Eu tenho outros afazeres hoje. Sim, isso mesmo. Enfrente seu maior inimigo em combate justo".

Herói estava encucado. Que idéia boba. Um desafio. Como que isso iria torná-lo corajoso? Se ele conseguisse achar o seu maior inimigo, era provável que fosse maior do que ele. E aí quem é que iria derrotar quem? Talvez Cuidador estivesse fazendo uma brincadeira com ele. Se Herói pudesse achar Amanda, ela iria poder avisá-lo se esse desafio era verdadeiro ou se era só uma brincadeira nova. Nessas horas Amanda estaria nos campos de treinamento, preparando-se para a Grande Celebração daquela noite.

Herói nunca ia para as Celebrações. Ele tinha medo de passar pelo Círculo das Chamas Sagradas. Era uma das razões porque ele sabia que nunca iria conseguir ser um Atalaia.

No seu caminho para os campos de treino, o menino encontrou-se com o Lenhador, que estava cortando árvores na Floresta Silvestre. Raios da luz do sol refletiam tons dourados no seu cabelo, enquanto trabalhava. "Cuidado!" gritou o homem. "A árvore está quase no ponto de tombar". Houve um estouro leve quando a madeira começou a rachar, e aí o grande carvalho veio estalando e tombando até o chão. O coração de Herói ficou impressionado com o poder magnífico da queda.

"Oi! Você parece ser um rapaz forte. Dá para me ajudar um pouquinho?" o Lenhador perguntou.

Herói pensou que ele fosse gostar de ajudar. Ele tinha um desafio a cumprir, mas aquilo dava para esperar. Pegou firme com uma das mãos em uma ponta do serrote. A sua outra mão ficou colada no seu rosto para esconder a cicatriz feia.

"O, rapaz", disse o Lenhador, "vai precisar das duas mãos para esse trabalho; duas mãos fortes. O ritmo vai assim: você puxa e depois eu puxo. Você puxa e depois eu puxo, tá?" Era um daqueles serrotes que têm um lugar para pegar nos dois lados.

Herói mostrou com um movimento da cabeça que estava pronto. Ele colocou as duas mãos na ponta do serrote comprido. Ele se sentiu nu e exposto, agora que sua cicatriz estava descoberta.

Mas o Lenhador só sorria. Ele não parecia surpreso ou espantado.

"É isso jovem. Tem que usar duas mãos fortes".

O rapaz e o homem trabalhavam bem juntos. Herói pegou o ritmo. Puxa-solta-puxa. Puxa-solta-puxa. Puxa-solta-puxa. Herói sempre dava umas olhadas para o Lenhador. Ele viu seus músculos fazendo sua camisa esticar; ele viu a graça e a habilidade do homem ao fazer a ferramenta trabalhar contra a madeira. Era gostoso fazer o trabalho de homem. Herói esqueceu que a sua cicatriz feia estava se mostrando.

Entre uma das serradas, os dois descansaram. "Você é um dos homens do Rei?" Herói perguntou.

"Sim, eu sou", disse o homem ao afiar os dentes do serrote com uma lima. E depois ele piscou: "Um dos melhores dos homens do Rei".

Quando a árvore enorme tinha sido cortada em peças de tamanho adequado, o Lenhador agradeceu ao rapaz. "Você é uma boa ajuda. Espero não o ter atrapalhado de fazer algo importante".

"Ah, não", respondeu Herói, ao cobrir o seu rosto de novo com a mão. "Eu só estava indo cumprir um desafio". Ele se sentiu meio bobo falando isso e esperava que o Lenhador não fosse rir dele. "É para eu enfrentar o meu maior inimigo em combate justo".

O Lenhador deu uma risada. Ele colocou o serrote pesado nos seus ombros. "Parece ser uma das idéias de Cuidador". O Lenhador virou-se para começar a descer a trilha e Herói notou que ele estava assobiando e ficou olhando para ele. Aí o homem virou-se de novo de volta para ele e o chamou. "O jovem, se você vai sair em busca do seu desafio e encontrar o seu maior inimigo, seria melhor você usar as duas mãos". Ele apontou com o queixo para aquela que Herói estava usando para cobrir a sua face. Surpreso, o menino meteu as mãos nos bolsos. O homem sorriu, virou-se, e foi-se embora.

Herói ficou com as mãos nos bolsos, enquanto caminhava pela trilha em direção aos campos de treinamento.

Em poucos momentos ele emergiu da Floresta Silvestre. Centenas de pessoas estavam ocupadas aperfeiçoando as suas habilidades no campo de treinamento. Um coral estava ensaiando algumas músicas, um grupo de dançarinas estava medindo bem os passos de uma velha dança. Herói pôde ouvir o Mestre Ritmo cantando em voz alta, "Um-e-dois-e-três-e-". Acrobatas estavam aperfeiçoando os seus saltos duplos e mortais para cima e para baixo, vez após vez. Um homem estava se equilibrando numa corda bamba. Músicos afinavam seus instrumentos.

Herói pôde ver Amanda, junto com outros arqueiros, puxando uma flecha por um arco grande e mirando para um alvo distante. A maioria das vezes ela acertava o que estava mirando. Herói ficou impressionado mais uma vez. Como que uma menina poderia mirar tão perfeitamente? Amanda nunca iria precisar de ser socorrida; bem, pelo menos por ele não.

Os arqueiros pararam para descansar um pouco. Herói sentiu o calor do sol e o cansaço do trabalho na floresta. Ele notou que grandes mesas estavam sendo arrastadas para a sombra debaixo das árvores. Ele foi para ajudar e, de repente, lembrou-se da despedida do Lenhador. "...seria melhor usar as duas mãos..."

Herói se sentiu bobo. Ele tinha gasto a sua vida inteira, desde aquele dia da marcação e o acidente, com uma mão no rosto. Como foi bom trabalhar com aquele serrote, usando as duas mãos. Ele fez questão de ajudar a arrastar as mesas, com as duas mãos.

Ele carregou travessas de frios, tigelas de frutas e cestos grandes de pães redondos e pães de centeio. Eu tenho gasto a minha vida inteira desequilibrado, ele pensou, impressionado com a sua descoberta. As duas mãos são para trabalhar. O Lenhador está certo. Terei uma terrível desvantagem se me encontrar com o meu maior inimigo com uma mão colada no meu rosto!

Ele girou e olhou de frente para os olhos das pessoas ao seu redor: os acrobatas, os malabaristas, os palhaços. Ninguém apontou. Ninguém se recolheu de horror. Um rapagão bateu-lhe nas costas e soltou sua voz: "não fique parado aí. Há uma sede tremenda se manifestando aqui. Coloque o suco de maçã nos copos".

Então Herói obedeceu. Ele usou uma mão para equilibrar o fundo da jarra pesada. Duas mãos, ele pensou. Duas mãos é melhor do que só uma.

Ele decidiu levar um copo até Amanda. Fez seu caminho por entre malabaristas e grupos de dança até chegar ao outro lado do campo de treinamento.

Quando ela o viu chegando, Amanda riu. Veio correndo até ele e pegou o refresco gelado que já tinha criado gotas de suor no lado de fora do copo.

"Ah, obrigada Herói", ela falou após ter engolido o suco. "Você salvou a minha vida. Estava morrendo de sede".

Herói deu risadas ao ouvir isso. Pena que Cuidador não pediu para ele socorrer uma princesa, Herói pensou. Acabei de salvar a vida de uma, ela mesma disse.

"Almoce com a gente", Amanda sugeriu. "Só vai demorar uma meia hora".

O Dia começou a esquentar e Herói se esticou na grama cheirosa. Seus braços se sentiram fortes e exercitados. Ele cruzou os braços por trás da cabeça. Quem seria seu maior inimigo? Ele se sentiu pronto para enfrentar esse inimigo nesse dia.

O que é uma cicatriz? Ele perguntou para si mesmo. Muitas pessoas têm cicatrizes. E aí Herói teve um pensamento novo. Talvez a cicatriz tivesse sarado aqui no Grande Parque. Talvez tivesse quase desaparecido. Muitas coisas poderiam acontecer. Ele até poderia tornar-se corajoso.... Foi então que ele adormeceu à luz brilhante do dia.

Antes de Herói ficar totalmente acordado de novo, ele ouviu como se fosse uma brisa brincando. Era Amanda dando risadas. Herói tinha descoberto que sempre ouvia a Amanda antes de vê-la. "Acorde seu preguiçoso. Estou morrendo de fome. Está na hora de comer". Ela o cutucou com seu dedão do pé. Ele agarrou o tornozelo dela com sua mão.

Ela tentou escapar.

Ele usou a outra mão para pegar firme, e puxou.

Ela tropeçou e caiu, deu umas cambalhotas, conseguiu ficar em pé ainda, e saiu correndo em direção das mesas com Herói correndo logo atrás. Com as duas mãos ele conseguia até derrubar a Princesa Amanda.

Uma vez à mesa, a princesa apresentou Herói ao grupo dos Malabaristas. Eles o receberam com alegria. Todos se silenciaram e foi dado início a um cântico. Todos deram as mãos e Herói pegou nas mãos das pessoas ao lado dele. Eles cantaram "Ao Rei, ao Rei. Ao Reino e ao Rei". Herói se lembrou do Cuidador cantando flores em existência naquela manhã. Ele se lembrou do som que o serrote fazia ao cortar a madeira e do ritmo que criava. Ele sentiu o pegar forte nas duas palmas da mão. Duas mãos, duas mãos...

"Você vai vir para a Grande Celebração hoje a noite?" Amanda perguntou. "Hoje vai ser a noite de apresentações, do circo, da festa de nomear, do desfile e do banquete...tudo junto. É quando todos os súditos tornam-se o que realmente são".

Herói pensou sobre o Círculo de Chamas Sagradas que eram acesas em torno do Círculo Íntimo onde a Grande Celebração se realizava. Ele sabia que seria realmente corajoso, quando passasse pelo fogo.

Depois do almoço, as duas crianças subiram o Monte dos Pinhais só porque acharam legal. Deste ponto podiam ver tudo pelos campos de treinamento. De lá de cima eles tinham uma vista de todo o Grande Parque. Herói podia ver a Entrada do Portal de Pedras e a Cidade Encantada além, dormente. Ele podia ver a Cabana do Cuidador e a linha das torres de vigia dos Atalaias. Ele e Amanda notaram os seis lugares que tinham queimado na Floresta Profunda; agora, círculos pretos. Hectares de árvores foram queimados. Troncos feios apontavam dedos e braços para o céu. Herói lembrou-se do Lugar da Marcação. Ele cobriu seu rosto.

"Pare com isso!" gritou a pequena menina, irritada.

"Parar com o quê?" disse Herói surpreso.

"De cobrir o seu rosto com a sua mão, é feio!"

Rapidamente, Herói pegou nos ombros da Amanda, e virou a princesa para que ela olhasse bem no rosto dele. "Amanda?" ele perguntou. "O que você vê quando você olha para mim?" Talvez a sua cicatriz tivesse desaparecido. Talvez Grande Parque e a cabana da Misericórdia e Cuidador tivessem feito algo maravilhoso para ele. Ninguém do campo de treinamento tinha apontado para ele e nem deram risadas. Seu coração batia forte, com esperança.

A princesa o olhou direto nos olhos. "Eu vejo um rapaz elegante com uma velha ferida no seu rosto".

"Ah," disse Herói desapontado.

"Mas não é só isso que eu vejo", a menina continuou. "Eu também vejo um herói".

Ele balançou a cabeça. Deu as costas, para ela não poder ver a sua cara. Sua voz estava baixa. "Que herói, que nada. Era para eu cumprir um desafio hoje. Era para enfrentar o meu maior inimigo em combate justo. O dia já está quase acabando e eu nem sei quem meu maior inimigo é..."

"Essa idéia veio de quem?" perguntou a voz baixa e impudente atrás dele. "Foi Cuidador que te mandou neste desafio, não foi?'

Herói virou-se de novo para olhar para ela. De propósito ele enfiou as duas mãos nos seus bolsos. "É uma brincadeira? Eu não dou certo com brincadeiras".

Amanda sorriu. Sua voz estava bem baixa. "Não é nenhuma brincadeira. Ele me mandou numa destas coisas também. Cedo ou tarde, ele manda todos num desafio. E todos começam enfrentando seu maior inimigo".

Herói queria cobrir a sua cicatriz, mas ao invés disso empurrou suas mãos mais prá dentro dos bolsos ainda. "Você enfrentou seu maior inimigo?"

Ela mostrou com a cabeça que sim.

"Quem que era?"

"O mesmo que é com todos". Amanda riu ao ver a sua careta perplexa. "Eu não posso ficar por aqui o dia todo, respondendo perguntas. Eu preciso ir e me preparar para a Grande Celebração".

"Ah, então vai", disse Herói bruscamente. "O que é que está te segurando?" Ele lutou contra a vontade de dar-lhe um empurrão em direção ao pé do monte.

"Não consigo ir", ela respondeu com sua voz autoritária. "Você está pisando no meu vestido!"

Herói sabia que ele nunca iria entender. A Amanda estava fazendo de conta ou só tentando enganá-lo? A única coisa que ele podia ver era a sua camisa e seus jeans desbotados. Mas, em Grande Parque, tudo poderia acontecer. As coisas sempre eram mais do que pareciam ser. Ele manteve a sua postura, se sentindo um pouco estranho: "Eu só vou sair do seu vestido, se você me disser o nome do seu maior inimigo".

Em um movimento relâmpago, Amanda deu uma rasteira nele e o fez cair ao chão. As suas mãos tinham ficados presas nos seus bolsos, inúteis. Ele caiu de costas e a menina estava em pé em cima dele com olhos brilhantes de vitória.

"Você não sabe? Todos têm o mesmo maior inimigo: eles mesmos. Precisamos enfrentar nós mesmos, antes que possamos fazer qualquer outra conquista".

Com isso, ela desceu o monte na carreira.

Com as costas coladas ao chão, Herói ouviu outra vez as palavras do Lenhador. Duas mãos...duas mãos. E era verdade; se ele usasse as duas mãos para o resto da vida, isso iria forçá-lo a enfrentar todos e tudo, incluindo ele mesmo.

Então, o menino aprendeu que desafios podem ser jornadas interiores tanto quanto jornadas exteriores. Há um reino dentro de nós que precisa ser conquistado primeiro, antes que alguém se torne corajoso o suficiente para desafiar o mundo fora dele. Isto é um conceito que todos os cuidadores da alma conhecem.


Obrigada e Have Fun!

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