segunda-feira, 4 de abril de 2011

Contos do Reino #3- Malabarista Aprendiz


Mateus 13:44,45

O Reino dos Céus é também como um negociante que procura pérolas preciosas. Encontrando uma pérola de grande valor, foi, vendeu tudo o que tinha e a comprou.

Marcos 8:35

Pois quem quiser salvar a sua vida, a perderá, mas quem perder a vida, por minha causa e pelo evangelho, a salvará.

Romanos 8:14

Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus.


MALABARISTA APRENDIZ

Havia um malabarista em Grande Parque, a terra do Rei, que queria mais do que qualquer outra coisa neste mundo se juntar à turma dos Malabaristas. Mas ele tinha algo terrível escondido no seu coração, um segredo que não tinha compartilhado com ninguém...

O Malabarista Aprendiz estava certo de que traria vergonha para a turma na apresentação daquela noite. Ele sabia que iria deixar cair um bastão durante a apresentação da pirâmide em cascata. Aí, o Mestre Malabarista iria ficar sabendo o seu segredo e ele, então, perderia o seu lugar nessa companhia de malabaristas. O nó na sua barriga parecia um gigante brincando de cabo-de-guerra.

Posicionando-se no meio da roda de treino, o Malabarista Aprendiz esquentou as suas mãos num retalho de luz da manhã. Aqueceu seus dedos com exercícios localizados. Começou jogando duas bolas em uma configuração básica de malabarista.

O Malabarista Aprendiz concentrou-se. Ele podia ouvir as palavras do Mestre Malabarista na sua primeira aula: "Ensine as bolas a dançarem. A palavra bola vem do francês. Quer dizer dançar. Faça as bolas dançarem!"

As bolas realmente dançaram nas mãos do Malabarista Aprendiz. Enquanto ele trabalhava sozinho, ele estava bem. Neste último ano, como aprendiz, ele aprendeu a fazer malabarismos com anéis, bastões, pinos de boliche e ovos (até uns não-cozidos). Podia rodar pratos em varas. Podia equilibrar guarda-chuvas na testa, nos ombros e nas mãos, tudo ao mesmo tempo.

Ele colocou três bolas em ação. Joga * Joga-cata * Cata; Joga * Joga-cata * Cata.

Ninguém sabia que ele estava lutando contra seu próprio ritmo interior. Ninguém sabia que uma batida diferente da do seu coração estava nas suas mãos.

Só quando o Malabarista Aprendiz trabalhava com os outros estudantes de malabarismo, ou quando fazia um ensaio com toda a turma, é que dava problemas.

Ele tropeçava.

Deixava bastões caírem.

Os outros pensavam que era porque não tinha experiência em malabarismo. Mas o jovem sabia que a sua batida interior era simplesmente diferente. Ele não queria que ninguém ficasse sabendo do seu segredo, especialmente o Mestre Malabarista. Trabalhar com a turma era o alvo glorioso de qualquer aprendiz.

As bolas dançaram nas mãos do Malabarista Aprendiz. Ele mudou para duas bolas e só uma mão. Ensaiou "chuveirinhos". Pegou dois pinos de boliche e testou o peso deles em cada mão. Jogou um bem alto. Deu duas voltas no ar. Introduziu um terceiro bastão, com o pé direito por fora. Também virou duas vezes no ar. Logo, até os pinos estavam dançando.

Ele se protegeu contra o seu próprio ritmo interior.

Um dos outros rapazes estava fazendo malabarismo com bastões. Chegou mais perto do Malabarista Aprendiz e começou a passá-los a ele. Seis bastões agora rodavam pelo ar. O jovem compassou em voz alta: "Um-dois-três...Um-dois-três...Um-dois-três...".

Até agora, tudo bem, pensou o Malabarista Aprendiz: se ele só pudesse contar em voz alta como estava fazendo agora. Mas todo malabarista sabia que esse era o sinal de um iniciante.

"Muito bem! Ótimo!" gritou o Mestre Malabarista. "Trabalho excelente hoje de manhã! E eu tenho uma notícia maravilhosa. O Rei estará presente na Grande Celebração hoje à noite. Estaremos fazendo as proezas para Ele!"

A turma inteira soltou um grito de aplauso, mas o coração do Malabarista Aprendiz despencou até a barriga de novo, onde assolava uma guerra. Ele já tinha feito malabarismos em outras Grandes Celebrações, com os outros estudantes. Hoje à noite era para ele fazer um solo e depois aparecer com todos para o final.

E se ele falhasse diante do Rei? Seria merecido pelo fato de ter mantido para ele mesmo esta coisa escondida. O único sonho que ele tinha era de ver o Rei sorrindo com prazer, ao ver seus malabarismos. Ele até imaginou o Rei aproximando-se dele e dizendo: "Jovem, você fez muito bem. Você tem um dom especial".

A voz do Mestre Malabarista interrompeu seus pensamentos: "Vamos ensaiar o final!"

A turma de malabaristas ficou em formação para a pirâmide em cascata. Quatro malabaristas se alinharam em fila. O sinal foi dado. "Já!" Todos contaram silenciosamente: Um, dois, três PULA! Três malabaristas pularam em cima dos ombros dos quatro primeiros.

O sinal veio de novo: "Já!" Um, dois, três, PULA! Um agarrar de mãos, um trepar, um pulo. Os dois aprendizes subiram até o topo.

Os bastões começaram a dar laçadas para cima, virando e girando, subindo a pirâmide. Oito vieram de baixo. Seis foram passados ao meio. Os aprendizes devolveram os bastões que chegaram até em cima, para os homens no lado de fora. Era uma manobra rápida mas simples ¾ isto é, enquanto o ritmo fosse mantido. O Malabarista Aprendiz sabia que todos os nove membros da turma estavam marcando o tempo silenciosamente: Joga * Joga-cata * Cata; Joga * Joga-cata * Cata....

Com horror, ele percebeu que o seu marcar do tempo estava fora do tempo de novo. Ele estava no interior dele marcando: Joga * Joga-cata * Joga! Ele se pegou a tempo e mudou o seu compasso, mas ficou como um sinal gritante e perigoso.

Será que ele deveria falar para o Mestre Malabarista? Mas como poderia suportar ver alguém tomar o seu lugar? O que iria acontecer, se ele seguisse o seu próprio ritmo interior? Que desastre sucederia?

Com ombros caídos, o Malabarista Aprendiz deixou o campo de ensaio e voltou para casa. Mais tarde, com as pernas molengas, ele fez seu caminhar até a grande abertura na Floresta Profunda. Era ali onde as Grandes Celebrações sempre se realizaram, rodeadas pelo círculo das Chamas Sagradas.

Os súditos do Rei já estavam começando a chegar para a Roda Íntima. As Chamas Sagradas que já estavam acesas, resplandeciam e dançavam em um grande círculo. Atalaias em suas capas azuis se posicionaram ao redor das chamas. A música da celebração já tinha começado.

O Malabarista Aprendiz observou os celebrantes atravessarem o círculo de chamas para dentro da Roda Íntima: esta cerimônia chamava-se "fazendo entrada". Ele avistou cada um tornar-se real ao fazer isso, por que as Chamas Sagradas mostravam as pessoas, não como aparentavam ser, mas como realmente eram. Todos os disfarces caíam.

Os risos, a música e o gozo dentro das chamas atraíam o Malabarista Aprendiz, mas ele se segurava. Como poderia fazer entrada com esta coisa escondida no seu coração? O seu segredo não seria revelado, quando ele tornasse real?

O velho e engraçado Cuidador atravessou as chamas. A sua forma tornou-se fosca por um momento, na luz brilhante. Aí ele fez entrada. Tornou-se alto, reto, ombros largos, usando a capa azul escuro e a fivela de prata de um Atalaia. Cuidador não era o que aparentava ser. Ele se tornou o Atalaia Comandante, o protetor chefe do parque e conselheiro íntimo do próprio Rei.

O Malabarista Aprendiz se contorceu. Lembrou-se de como Cuidador o tinha achado, quando era criança pequena, abandonada e faminta, e o levou até Misericórdia que o amou e cuidou dele. Lembrou-se de como Cuidador e Misericórdia odiavam coisas escuras e escondidas.

Ele decidiu esperar pelo Mestre Malabarista e revelar o segredo escondido de que o seu ritmo interior era diferente e perigoso à turma. O Malabarista Aprendiz iria pedir para escolher outro para o final. Era o único jeito.

Um soluço sacudiu seus ombros. Nunca mais sentiria o gosto de segurar bastões ou a emoção de objetos dando cambalhotas. Nunca mais o ritmo maravilhoso da turma de malabaristas.

Ele daria o seu lugar a outro. Qual seria então o seu fim? Onde seria o seu lugar? O jovem sabia que nunca seria um bom padeiro ou jardineiro, ou guarda florestal. Ele não suportava dançar ou cantar. Não tinha nenhum desejo de ser um Atalaia. A única coisa que ele quis fazer foi ver bolas, bastões, anéis e ovos ¾ não cozidos ¾ dançarem.

Indignado, o Malabarista Aprendiz jogou para o alto as bolas que segurava. Desta vez, ele marcou o seu próprio tempo. Era o que suspeitava: as bolas se mexiam em intervalos desajeitados. O jogar das bolas não era fluido. O ritmo aumentava e diminuía, criando incerteza. Ele tinha que contar o seu segredo. Ele nunca seria igual aos outros malabaristas.

Um mendigo estava se aproximando do círculo de fogo. O homem vestia uma capa marrom com um capuz que cobria o seu rosto. Carregava um cajado e mancava. "Um trocado por favor! Um trocadinho!" ele gritava. "Moedinhas para o pobre!"

O mendigo parou perto do menino e perguntou: "Malabarista, você está participando da apresentação na Grande Celebração?"

O jovem balançou a cabeça. De repente, ele queria soltar o seu segredo. Ele queria dizer: "Eu tenho algo escondido no meu coração".

O mendigo acenou para ele achegar-se mais perto e sussurrou: "Eu vi você treinando agora mesmo. Marque o seu próprio tempo. Escute o ritmo da sua própria cadência".

O Malabarista Aprendiz ficou maravilhado. Como um mendigo iria saber que sua cadência estava fora, se ele tinha guardado isso para si e não contado a ninguém?

O mendigo riu e disse: "Eu entendo. O meu ritmo é diferente também". Com isso o mendigo se virou para fazer entrada.

O menino ouviu os Atalaias gritarem: "Ao Rei! À Restauração!" A forma do homem passou para dentro da Roda Íntima. Um grito de reconhecimento subiu. Pessoas vieram correndo para receber o recém-chegado. Gritaram boas-vindas e chamaram um ao outro.

O Malabarista Aprendiz arregalou os olhos. Ele não estava preparado para o que aconteceu. O homem estava lá, transformado. Ele tinha a mesma altura do Atalaia Comandante e era elegante. A luz das chamas dava um reflexo dourado em seu cabelo. Ele agachou-se e pegou uma pequena criança e colocou-a em cima dos seus ombros largos. Misericórdia, jovem e linda, agora que ela tinha dado entrada, veio correndo de um lugar dentro do círculo e pegou a sua mão. Ela chamou seu marido, Atalaia Comandante, que se aproximou e fez continência ao Rei.

O mendigo é o Rei, pensou o Malabarista Aprendiz. Ele disse: "Marque o seu próprio tempo".

O Rei elevou o outro braço; o primeiro ainda segurando a pequena criança. "Deixe a celebração começar!" veio o comando.

Malabarista Aprendiz correu para fazer entrada. Os malabaristas eram os primeiros e ele deveria fazer um solo logo no começo da apresentação.

Em resposta ao comando do Rei, os músicos começaram a tocar uma melodia alegre que dava vontade de marcar o tempo com o pé. Isso chamava os súditos da Floresta Profunda para atravessarem as Chamas Sagradas, para dentro da Roda Íntima. Os malabaristas estavam se aglomerando no coração da celebração. O Rei e os seus seguidores andavam em círculo ao redor deles. Todos batiam palmas no ritmo da música.

A turma estava fazendo malabarismos: cada um para si, alguns com bolas, outros com anéis. Logo veio o momento para a apresentação do solo do Malabarista Aprendiz. Todos pararam.

O coração do jovem estava na sua garganta. E se ele deixasse uma bola cair? E se tropeçasse? E se não conseguisse manter o controle do seu tempo? Foi então que ele se lembrou das palavras do Rei Mendigo: "Ouça o marcar do tempo do seu próprio ritmo interior".

Ele deu ouvidos. Uma cadência nova estava surgindo dentro dele: a sua própria cadência. Gozo veio jorrando, encheu suas mãos e seu coração. Esta cadência era diferente de todas as outras que ele já tinha ouvido: Joga * Joga-cata * Cata * Cata-cata * Joga; Joga * Joga-cata * Cata * Cata-cata * Joga...

Ele jogou uma laranja alto, mas bem alto no ar, e logo outra e depois outra. Ele catou a primeira laranja bem em tempo, centímetros do chão. A multidão suspirou. Ele catou a segunda e a jogou próximo, rebatendo com o seu pé. O povo suspirou de novo; depois todos riram. O Malabarista Aprendiz mergulhou para pegar a terceira; jogou para o alto, deu uma cambalhota, catou a seguinte rente ao chão, arremessou-a rapidamente de volta para cima. A multidão soltou seus brados.

Ele ouviu os cochichos: "Que maravilhoso!" "Nunca vi um malabarista fazer tantas coisas como este!" "Que diferente!"

Ele continuou a dar ouvidos para a cadência interior: Joga-cata * Cata * Cata-cata * Joga. Ele arremessou e deu cambalhotas e mergulhou e marcou o tempo. Finalmente, ele encerrou. Todos riram, aplaudiram, gritaram e bateram os pés.

O Malabarista Aprendiz se curvou. Levantou-se, e se dobrou de novo. Desta vez, quando ele se levantou, estava olhando direto nos olhos do Rei.

O Rei estava sorrindo em aprovação.

"Um palhaço! Um palhaço!" alguém estava gritando. Era o Mestre Malabarista.

"Você tem o ritmo de um palhaço!" ele cantou. "Parece que você não vai conseguir...parece que você vai deixar algo cair, mas não deixa! Um palhaço é o melhor malabarista de todos!"

O Mestre Malabarista ficou sério. Ele chacoalhou os ombros do malabarista. "Por que você não me disse que o seu ritmo era diferente?"

"Por-porque", gaguejava o jovem entre as chacoalhadas. "Eu pensei que-que iria perder o meu lugar na turma dos malabaristas".

O Mestre Malabarista parou de chacoalhá-lo. "Perder o seu lugar? Melhor ainda é achar o seu devido lugar! Não sabia que, na Grande Celebração, todos que desejam um lugar acham seu lugar?"

Com isso o Mestre Malabarista deixou sua cabeça cair para trás e soltou uma gargalhada. "Um Malabarista com o instinto de um palhaço! Ah! São tão raros! Tão raros! Que turma teremos! Todos vão adorar! Faremos as bolas dançarem!"

E, então, o Malabarista Aprendiz perdeu o seu lugar na turma dos malabaristas, mas achou um outro. Porque todos os que vivem pelo ritmo da sua cadência interior, aquela que ao Rei aprouver, acham um lugar só seu no Reino. Mais do que outros, vivem felizes daquele dia em diante.


Obrigada e Have Fun!


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